quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Dia do Psicólogo - reflexões ainda necessárias





Hoje, 27 de agosto, é comemorado o Dia do Psicólogo.
 
É um dia para lembrarmos da essência do que estudamos e refletirmos sobre nossa prática.

Começamos nossas reflexões acerca da data com uma imagem interessante. Na citação, Vigotski atrela a compreensão do humano à compreensão da sociedade como um todo. Para os familiarizados com a teoria histórico-cultural essa relação é óbvia, mas muitos podem estranhar que os psicólogos estejam discutindo a sociedade, e não as pessoas individualmente.

É comum que a Psicologia seja lembrada apenas atrelada à clínica individual. A imagem mais conhecida da profissão continua sendo ligada aos testes psicológicos e à clínica na saúde, atividades que consagraram a psicologia no Brasil e marcaram a atuação tradicional, muitas vezes destituída do compromisso social que hoje se busca pra profissão.

Atualmente, o psicólogo se insere em diferentes espaços na sociedade (políticas públicas de assistência, serviços de saúde, escolas, empresas, campo jurídico, esporte, comunidades e outros). Além dessa abrangência cada vez maior, é maior também o potencial de discussão sobre a ética política da Psicologia brasileira. Buscamos superar o histórico de uso da profissão para manutenção do status quo e para fortalecimento de estereótipos (como no uso indevido da avaliação psicológica para fins de classificação e exclusão de pessoas).

O movimento hoje é o de fortalecer cada vez mais o potencial transformador que a Psicologia pode ter. Não só em relação à transformação individual através dos atendimentos na saúde, mas principalmente a transformação social, a partir da inserção nas políticas públicas e no real compromisso com a superação das injustiças sociais tão presentes no nosso país. 
O psicólogo não se encontra mais "fechado" em seu consultório e, ainda nos momentos em que está, entende que aquela atividade também é política e também é social, tendo em vista o que já discutimos aqui sobre a visão de Vigotski acerca da subjetividade.

Essas ideias já estão presentes na Psicologia Histórico-Cultural desde sua criação. Quando iniciou seus estudos sobre a Psicologia, Vigotski vivia as inquietações da Revolução Russa e estudava as idéias de Marx acerca da sociedade. A partir dessas inquietações, ele passou a criticar a Psicologia de sua época, pois via nela uma fragmentação do humano, além de não conseguir identificar em nenhuma teoria a análise social tão necessária para uma ciência que pretendesse compreender o homem que vive em relação com outros homens.

A Psicologia Histórico-Cultural nasce da negação da neutralidade científica. É uma Psicologia comprometida, que enxerga a luta de classes e as incoerências sociais e busca não só compreender a subjetividade a partir dessas questões, mas também se posicionar enquanto ciência, contribuindo para a transformação social.

O interesse de Vigotski foi o de elevar o social ao ponto alto da ciência psicológica e deixar claro que não há como estudar o homem descontextualizado de suas relações sociais, pois é a partir delas que a subjetividade se forma. Assim, não há, nessa teoria, um modelo universal de homem, ao contrário, estuda-se o homem em movimento e em constante relação de construção da sociedade e de si próprio. Se faz fundamental, portanto, compreender a forma como a sociedade se organiza para então compreender que formações humanas emergem dessa sociedade. Nas palavras do autor:

Do mesmo modo que a vida de uma sociedade não representa um único e uniforme todo, e a sociedade ela mesma é subdividida em diferentes classes, assim também, não pode ser dito que a composição das personalidades humanas representa algo homogêneo e uniforme em um dado período histórico, e a psicologia tem que levar em conta o fato básico que a tese geral que foi formulada agora mesmo, só pode ter uma conclusão direta, confirmar o caráter de classe, natureza de classe e distinções de classe que são responsáveis pela formação dos tipos humanos. As várias contradições internas que são encontradas nos diferentes sistemas sociais encontram sua expressão tanto no tipo de personalidade quanto na estrutura da psicologia humana naquele período histórico” (VIGOTSKI, A transformação socialista do homem, 1930).

Fica claro, assim, que há diferenças na constituição subjetiva das pessoas que vivem realidades distintas. Em um país como o nosso, com abismos econômicos e sociais bastante marcados, é urgente que se fortaleça uma Psicologia comprometida não com a neutralidade, mas com o posicionamento político! 

Por isso, no dia do psicólogo, precisamos refletir sobre o mundo contemporâneo e o papel da Psicologia nesse mundo; sobre os espaços e grupos sociais que necessitam do nosso trabalho; e que sociedade temos ajudado a construir através da nossa atuação prática.
É um dia para reafirmarmos a luta de tornar o saber psicológico acessível à maioria da população, principalmente àquela parcela que depende de políticas públicas. Precisamos construir uma Psicologia que cada vez mais se comprometa com a construção de condições dignas de vida em nossa sociedade, de forma que o desenvolvimento cultural seja um direito de todos os brasileiros, independente da condição financeira. Esse é o compromisso social necessário à nossa profissão hoje. O que mostra quão contemporâneas são as ideias de Vigotski.

Feliz dia do Psicólogo pra todos nós!